A Florista e o Herdeiro
Em meio à névoa que cobria as ruas de Londres, a jovem Eliza percorria as calçadas com um cesto de flores coloridas pendurado em seu braço. Filha de um humilde florista que vinha bastante adoentado, Eliza herdara do pai não apenas o ofício, mas também um encanto singular, que fazia suas violetas e rosas parecerem mais vivas, mais vibrantes. Suas mãos, embora calejadas pelo trabalho, tratavam cada flor como se fosse um tesouro, e sua risada, livre e genuína, era capaz de iluminar até mesmo os recantos mais sombrios da alma de uma pessoa.
Certo dia, enquanto vendia suas flores na esquina de uma rua movimentada, Eliza chamou a atenção de um jovem cavalheiro. Henry, herdeiro de uma das famílias mais ricas e influentes da cidade, viu-se cativado não apenas pela beleza das flores, mas principalmente pela graça e simplicidade da florista. Em um impulso, comprou um pequeno buquê e trocou algumas palavras com Eliza, sentindo uma conexão instantânea, uma faísca de algo verdadeiro e puro que há muito não encontrava em sua vida de luxos e obrigações.
Apesar de pertencer à uma família tão abastada, encontrava-se constantemente envolvido pelo manto opressor da melancolia. Era como se algo estivesse faltando em sua vida. Um sentido ou um propósito maior. Enquanto caminhava cabisbaixo pelas ruas da cidade, ouvira um som cristalino e belo que acendeu uma chama dentro dele, fazendo-o esquecer-se de seus lamentos. Seguiu o som gracioso e deparou-se com a criatura mais adorável que seus olhos já viram.
Contudo, antes que Henry pudesse inteirar-se mais sobre a jovem que tocara seu coração, foi chamado às pressas por seu mordomo que havia chegado na carruagem da família. Uma emergência familiar exigia sua atenção imediata. Quando finalmente conseguiu se desvencilhar das demandas familiares, Henry retornou à esquina onde encontrara Eliza, mas ela já havia partido, deixando para trás apenas o eco de sua risada e o perfume suave de suas flores.
Consumido pela necessidade de reencontrar Eliza, Henry iniciou uma busca incansável. Vasculhou as ruas de Londres, visitou inúmeros mercados de flores e perguntou por ela a cada vendedor que encontrava, mas ninguém parecia conhecer a jovem florista. Com o coração pesado, Henry começou a perder as esperanças.
Foi então que algo inesperado aconteceu: um cortejo fúnebre cruzava a rua de um dos bairros pobres onde fora investigar. Sua doce senhorita era uma das pessoas que seguia a procissão, cabisbaixa e chorosa. De longe, Henry acompanhou comovido todo o enterro e esperou até o momento em que a sua florista estivesse sozinha para aproximar-se. Ele não poderia perder aquela oportunidade.
— Com licença, senhorita Eliza. — Disse ele hesitante.
A jovem de olhos claros e cabelos vermelhos como fogo voltou-se para ele e franziu o cenho delicado.
— Desculpe-me, mas acho que o senhor se confundiu. — Ela respondeu baixinho.
— Não! Tenho certeza que era você nas ruas da cidade, vendendo suas lindas flores. Nós conversamos algumas semanas atrás. Não se recorda? Esperei tanto por este momento! Queria muito reencontrá-la e ouvir o som de sua voz novamente.
Ao ouvir aquilo, a jovem foi acometida por uma nova onda de pranto. Ela tentou em vão secar as lágrimas com seu lencinho. Então, Henry gentilmente retirou seu lenço de linho perfumado e entregou a ela. Ele queria abraça-la, não suportava vê-la naquela tristeza.
Ao ficar mais calma, a jovem falou com a voz quebrada.
— A moça que você procura estava naquele caixão que acabamos de enterrar. Ela era minha irmã gêmea e vendia aquelas flores nas ruas para ajudar a pagar o tratamento de nosso pai.
Ao ouvir aquilo, Henry sentiu o chão desaparecer sob seus pé e foi acometido por uma palidez mortal. Ele levou a mão até o coração partido e permaneceu mudo de choque.
— Ela trabalhou até o ultimo dia de sua vida. — A jovem lamentou.
Pouco a pouco, os presentes foram indo embora até que ele ficou sozinho diante do túmulo humilde. Pranteou sua malfadada sorte de encontrar e perder um grande amor ao mesmo tempo.
— Sr. Henry? — Uma voz suave o chamou.
Ao se virar, foi tomado por um grande assombro. Eliza, a sua florista, estava parada diante dele com seu cesto de flores. Estava mais bonita do que nunca.
— Mas você está… está… — Ele gaguejou confuso.
— Sim, é verdade. Não estou mais nesse mundo, mas isso não significa que estou morta. Estou viva, mas em outra dimensão. — Respondeu ela com naturalidade.
Ela se aproximou e parou ao seu lado.
— O que você sentiu por mim foi puro e genuíno e eu senti o mesmo. Porém, Deus tinha outros planos para nós. Eu vim aqui apenas pedir para que você não se feche para o amor, nem se entregue ao pessimismo. Deus fecha uma porta, mas sempre abre uma janela.
Henry, embora surpreso pela súbita aparição, ouviu cada palavra que ela dizia sentindo-se menos pesaroso.
— Aproxime-se de minha irmã Clara. Ela é uma boa moça. Ela é meiga e gentil; tenho certeza que o fará muito feliz. — Eliza suspirou e acrescentou cabisbaixa. — E logo ficará sozinha, pois nosso pai também partirá desta vida em breve.
Após um curto silêncio, ela virou-se para Henry.
— Tenho que ir agora. Obrigada, Henry. Obrigada por ter me amado; mesmo que não tenhamos podido ficar juntos nessa vida. E considere meu pedido com carinho. Clara não sabe ainda, mas vai precisar muito de seu amor também.
Assim, ela se afastou e desapareceu deixando Henry estupefato. Um aroma maravilhoso de rosas permeava o ar e o acompanhou até chegar em casa. A princípio ele se recusou a acreditar, tomando o acontecimento por uma alucinação, porém, sempre que passava pelo local onde conhecera sua florista, uma forte impressão tomava conta dele, impelindo-o a seguir o conselho de sua amada.
Os dias se passaram e Henry tornou a encontrar Clara. Apesar de ser praticamente uma cópia física de sua florista, ele viu que ela era diferente em vários aspectos e que possuía uma personalidade adorável. Seu sorriso, seus trejeitos e seus olhos brilhantes o cativaram Completamente. Então foi tomado por uma nova onda de afeto e entendeu que sua florista não tinha sido um ponto final, mas uma ponte para que ele encontrasse um grande amor e a cura para sua tristeza sem sentido.
E assim, contra todas as amarguras e perdas, Henry e Clara provaram que o amor verdadeiro não conhece barreiras. Quando duas pessoas estão fadadas a se encontrar a Vida encontra um meio de aproximá-las e dar a elas o verdadeiro Felizes para Sempre.


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